Uma investigação publicada na edição de agosto do Journal of Proteomics, em que é co-autor o investigador da Unidade de Ensino e Investigação de Microbiologia Médica do IHMT, Celso Cunha, revela a existência de uma associação entre a infeção crónica com vírus da hepatite delta (VHD) e o cancro hepatocelular, através da identificação de um mecanismo envolvido na replicação do VHD que potencia o desenvolvimento de células cancerígenas.
A infeção com o VHD, o agente infecioso da hepatite D, está associada a um aumento da incidência de carcinoma hepatocelular. Através de uma abordagem de proteómica (análise das proteínas e variantes de proteínas), a investigação revela quais as alterações na expressão de genes celulares que resultam da replicação deste vírus.
A divisão celular ocorre em várias fases, sendo que a transição entre a fase G2 e a M corresponde a um “ponto de controlo” neste processo. O estudo mostra, pela primeira vez, que o VHD altera o ciclo normal de regulação das células nesse ponto preciso: entre a fase G2 e M, provocando erros no ciclo. Os investigadores acreditam que a interferência do vírus com o este controlo é a causa do desenvolvimento de processos carcinogénicos nas células.
Para além disso, os investigadores mostram ainda que algumas proteínas celulares que participam no suicídio das células cancerígenas são sintetizadas em menor escala na presença do VHD, o que contribui para reduzir as defesas do organismo e potenciar o desenvolvimento de cancro.
O vírus da Hepatite D (ou Delta) depende da presença do vírus da Hepatite B para se multiplicar e infetar o fígado, nos seres humanos. Tem um período de incubação entre 15 a 45 dias e mantém-se por muito tempo no sangue. Transmite-se pelas mesmas vias do vírus da Hepatite B: sangue e transfusões sanguíneas, durante o parto e através da partilha de seringas infetadas ou objetos de higiene pessoal (lâminas de barbear, escovas de dentes, etc). É mais prevalente na bacia do Mediterrâneo, Médio Oriente, Ásia Central, África Ocidental, América do Sul e em algumas ilhas do Pacífico Sul.
A descoberta deste mecanismo de formação do cancro associado ao VHD poderá contribuir, a longo prazo, para o desenvolvimento de terapias específicas, atualmente ainda indisponíveis aos doentes.